Por José Geraldo de Santana Oliveira*
Os indicadores sociais revelados pela Pnad contínua de março, abril e maio de 2025, divulgados aos 27 de junho último, desafiam o movimento sindical, tal a qual a Esfinge da peça de Sófocles, Édipo Rei, desafiava quem a chegava a Tebas: “Decifra-me ou devoro-te”.
Os realçados dados já passaram da ameaça ao movimento sindical dos/as trabalhadores/as. Na verdade, estão esvaziando-o a passos largos e céleres, como se colhe de sua simples leitura.
Ei-los:
População ocupada: 103,9 milhões
– População fora da força de trabalho: 66,7 milhões
– Empregados com carteira assinada: 39,8 milhões
– Empregados sem carteira assinada: 13,7 milhões
– Trabalhadores por conta própria: 26,2 milhões
– Trabalhadores informais: 39,3 milhões
Tendo por base a população ocupada de 103,9 milhões, descontando-se 4,3 milhões de empregadores, remanescem 99,6 milhões, que são trabalhadores; desses, somente 51,87% gozam de direitos trabalhistas, sendo 39,8 milhões com carteira assinada no setor privado, 1,4 milhão de doméstico com carteira assinada e 13,7 milhões que trabalham no serviço público.
Aos demais 44,07%, são negados todos os direitos. Ou seja, acham-se alijados dos direitos trabalhistas 39,3 milhões de informais e 4,6 milhões de domésticos.
Além disso, não se pode perder de vistas que dentre os que se encontram agasalhados pelos direitos trabalhistas e, portanto, protegidos pelos sindicatos, 15 milhões são terceirizados, a quem o STF considera como subclasse- recurso extraordinário 635646 – Tema 383; considerável parcela dos 19 milhões de subutilizados; e as centenas de milhares com contrato intermitente; que, de acordo com as sábias palavras o ministro Edson Fachin, nas ADIS 5826, 5829 e 6154, representa zero hora de trabalho e zero salário.
A singela comparação entre os indicadores atuais com os de 2014, mostra-se bastante para se concluir o quanto o Brasil involuiu em garantia de direitos sociais, bem como para se constatar o absurdo esvaziamento da representação sindical:
I total de trabalhadores sem carteira assinada: 13, 7 milhões. Em 2014, eram 10,8 milhões;
II total de domésticos: 6 milhões, dos quais 1,4 milhão, com carteira assinada; em 2012, eram, respectivamente, 6,1 milhões e 1,3 milhão;
III trabalhadores por conta própria: 26,1 milhões; recorde na série histórica. Em 2014, somaram 20,9 milhões;
IV total de informais: 39,3. Em 2014, eram 31,7 milhões, para a população ocupada de 92,2 milhões;
V população subutilizada: 19 milhões; em 2014, somou 17,8 milhões.
Como se constata pelo cotejo dos números de 2024 com os de 2014, dissipam-se, a olhos vistos, a proteção social e os direitos fundamentais sociais e a representação sindical, respectivamente, assegurados pelos Arts. 7 e 8º da CF.
Esse cenário de desolação, além de demonstrar a permanente e crescente dilapidação dos direitos trabalhistas e da representação sindical, desautoriza e põe por terra todas as falsas promessas dos embaixadores da (de) reforma trabalhista- Lei N. 13467/2017, que prometia criação de bons e empregos e que não haveria precarização das condições de trabalho.
Dentre esses embaixadores do capital, desafortunadamente, avulta-se a figura do presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, que continua com a mesma cantilena, como atesta sua recente entrevista ao jornal Folha de São Paulo, publicada aos 4 de julho corrente; nela, chega ao despropósito de afirmar que excesso de proteção, acaba por desproteger o trabalhador. Por essa e outras assertivas, o citado jornal destacou a “Sensatez de Barroso”.
Somam-se a esse quadro de desespero e desesperança os dados divulgados pela Previdência Social, contidos no seu Anuário Estatístico de 2023, segundo os quais, ao final daquele ano, havia 77,8 milhões de contribuintes pagantes; neles, incluídas todas classes de contribuintes, quais sejam: empregados, autônomos, contribuintes individuais, MEIs, donas de casa, estudantes etc.
Incluindo-se aos 77,8 milhões de contribuintes os 40,4 milhões de beneficiários de aposentadorias- dentre os quais alguns milhões continuam contribuindo-, pensões por morte, auxílio-doença, comum e acidentário, e BPCs, tem-se que, dos 212 milhões de habitantes revelados pelo último censo demográfico, pelo menos 94 milhões não se acham acobertados pelo manto protetivo da previdência social.
Esse é o quadro que reflete o Brasil real e que precisa ser enfrentado, com urgência e vigor, por todos quantos efetivamente querem construir o bem-estar e a justiça sociais, que determina o Art. 193 da CF.
Urge que o movimento sindical saia do estado letárgico em que se encontra, quanto ao inadiável e vigoroso enfrentamento dessa estrutura perversa; começando pela inclusão de quem não tem carteira assinada, trabalha por conta própria, é autônomo, pejota, desempregado e desalentado, assumindo sua representação e empunhando a bandeira da extensão de todos os direitos sindicais e trabalhistas a eles, não há perspectiva de mudanças estruturais positivas.
A Contee, em seu vitorioso XI Congresso, realizado de 11 a 13 deste mês, em Brasília, deu significativo passo nesse sentido, ao promover profunda reformulação no Art. 1º, de seu Estatuto, exatamente com a finalidade de promover essa inadiável ampla inclusão; nele, estabelecendo:
“Art. 1º CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES EM ESTABELECIMENTOS DE ENSINO, designada abreviadamente pela sigla CONTEE, com sede e foro na cidade de Brasília, Setor Bancário Sul, quadra 01, Edifício Seguradoras, 15º andar, CEP 70.093-900, Asa Sul, Brasília, Distrito Federal, e base territorial em todo o país, em conformidade com seu registro no M T E, é entidade sindical de grau superior do sistema confederativo brasileiro, de caráter permanente, constituída para coordenação e representação, no âmbito, de sua competência, de sindicatos e federações que representam trabalhadores (as) em estabelecimentos de ensino privado, de nível básico e superior, em todas as etapas e modalidades, abrangendo as diversas formas e modalidades de contratação, dentre elas a terceirizada, a pejotizada e a autônoma; e, ainda, os aposentados, as aposentadas e aqueles e aquelas que se acham involuntariamente desempregados e desempregadas, conforme respectivos estatutos.”
Tomara que essa corajosa e imprescindível alteração promovida pela Contee, prontamente, se constitua em fonte de inspiração e desafio para as entidades a ela filiadas a igualmente fazê-lo, com brevidade.
Parafraseando o inesquecível filosofo húngaro Istvan Mészáros, essa é a primeira montanha a ser conquistada.
É o que se espera!
*José Geraldo de Santana Oliveira é consultor jurídico da Contee.
Fonte: Contee.